quarta-feira, 14 de novembro de 2012
EXCLUSIVO: MINISTROS DO STF CRITICAM SISTEMA PRISIONAL DO PAIS APÓS CONDENAÇÃO DO MENSALÃO.
Ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) se revezaram em críticas ao sistema prisional brasileiro durante a sessão desta quarta (14) de julgamento do mensalão.
As falas dos ministros começaram com uma manifestação de Dias Toffoli e foram motivadas pela declaração desta terça (13) do ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, que disse a empresários em São Paulo que "preferia morrer" a ficar numa prisão brasileira. Nesta quarta, Cardozo justificou a declaração dizendo que "não se pode esconder o sol com a peneira".
Ao iniciar a fala, Toffoli destacou que todos os jornais repercutiram nesta quarta a declaração de José Eduardo Cardozo e defendeu que os réus do processo do mensalão sejam punidos com multas maiores e penas menores. Ele destacou que a medida é mais efetiva e tem valor "pedagógico" do que as prisões.
"A filosofia da punição daquele que comete um delito está em debate na sociedade contemporânea há muito tempo. Esse parâmetro do julgamento em 2012 não é o parâmetro da época de Torquemada, da época da condenação fácil à fogueira. Eu fico pensando - temos aqui pessoas que desde 2006 nao têm condição de sair às ruas. Tivemos ministros agredidos, advogados agredidos", afirmou Toffoli.
A intervenção de Toffoli ocorreu durante a discussão da pena de lavagem de dinheiro para o ex-vice-presidente do Banco Rural José Roberto Salgado.
O relator, ministro Joaquim Barbosa, havia proposto prisão de 5 anos e 10 meses e multa de R$ 431,6 mil (166 dias-multa). O revisor, Ricardo Lewandowski, sugeriu pena de 4 anos e 8 meses e multa de R$ 36,4 mil (14 dias-multa).
Toffoli, então, votou pela pena proposta por Lewandowski e pela multa sugerida por Barbosa.
"Aquele que comete um desvio com intuito financeiro – e aqui o intuito final era financeiro, não era violência, não era atentar contra a democracia e contra o estado democrático de direito porque eles são muito mais sólidos do que isso. O intuito era o vil metal. Que se pague, então, com o vil metal", defendeu Toffoli.
Para o ministro, o Judiciário tem aplicado "muito pouco" as penas disciplinares. "Já ouvi leituras dizendo que o pedagógico é colocar na cadeia. O pedagógico é recuperar os valores desviados. Muitas vezes, no cálculo do custo-benefício, vale a pena passar algum tempo na cadeia pelo custo-benefício", declarou.
'Inferno nos presídios'
O ministro Gilmar Mendes falou na sequência e disse que o Judiciário precisa agir para acabar com a superlotação de presídios.
"Temos um inferno nos presídios. Temos 70 mil presos, pelo menos, em delegacias. São presos ilegalmente. Aí [dizem que] não há recursos para fazer presídios. [...] Tínhamos casos de presos no Pará que estavam passando fome. É preciso, realmente, que o governo participe desse debate sobre segurança porque tem os recursos e tem a missão de coordenar. Isso [construção de presídios] nunca foi prioridade e por isso temos esse estado de caos", disse.
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'Depósito de presos'
O ministro Celso de Mello, mais antigo do Supremo, também criticou o sistema penitenciário.
"Por responsabilidade imputável ao estado, a crise do sistema penitenciário tem se demonstrado crônica. O descaso, a absoluta negligência, a indiferença do estado às funções da pena. A pessoa acaba por sofrer penas sequer previstas no Código Penal, que a legislação repudia."
Ele lembrou a declaração pública de Cardozo, mas citou que é "grande a responsabilidade do Ministério da Justiça".
"A prática da lei de execução penal se tornou entre nós um exercício quase irresponsável de ficção jurídica, na medida em que o Estado mantém-se absolutamente indiferente, desinteressado, dessa fase de execução das sanções penais determinadas pela Justiça."
Celso de Mello chamou os presídios de "depósito de presos". "O que temos visto na triste realidade penitenciária brasileira é um depósito de presos, pessoas abandonadas a própria sorte, por irresponsabilidade do poder público. Por isso, acho importante que o ministro da Justiça tenha feito de maneira muito cândida e franca no dia de ontem."
ENTENDA A PENA POLITICA DE CADA UM.
O Supremo Tribunal Federal (STF) começa a definir na próxima semana qual será a punição para os réus do processo do mensalão que foram condenados. Até agora, 25 acusados foram considerados culpados pela corte de esquema de compra de votos no Congresso Nacional em troca de apoio político ao governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A chamada dosimetria da pena (tempo da punição de cada réu condenado) é feita com base em três pilares, o chamado regime trifásico: fixa-se a pena base considerando a culpabilidade, antecedentes criminais, motivos, consequências do crime e outros.
Depois, são analisadas as situações agravantes e atenuantes, aumentando ou diminuindo a pena. Em um terceiro momento, são discutidas as causas de aumento e de diminuição. Verifica-se nessa fase se houve concurso formal, concurso material ou crime continuado - entenda no quadro abaixo.
ENTENDA AS DIFERENÇAS ENTRE OS CRIMES PARA EFEITO DO CÁLCULO DA PENA
Concurso material: quando o mesmo crime é praticado várias vezes, soma-se a pena para cada vez que o crime foi cometido.
Concurso formal: quando com uma só ação se pratica mais de um crime, então é aplicada a pena mais grave para aquele crime, podendo ser ampliada de um sexto até a metade.
Crime continuado: quando o segundo ou demais crimes são continuação do primeiro, então é aplicada a pena mais grave ampliada de um sexto até dois terços.
Fonte: Código Penal
Os pedidos de condenação são, na maioria, em concurso material, mas os ministros podem interpretar que houve concurso formal ou crime continuado.
Além disso, há atenuantes ou agravantes: se o acusado é réu primário (não tem condenações anteriores transitadas em julgado, ou seja, sem a possibilidade de mais recursos); se tem mais de 70 anos na data da sentença; se tem condições psicológicas desfavoráveis; se confessou o crime; ou se cometeu violência ou grave ameaça à pessoa.
Um dos agravantes é o abuso de poder ou violação de dever inerente ao cargo.
Cada crime apresenta causa específica de aumento ou diminuição. Corrupção ativa, por exemplo, pode ter pena aumentada se o servidor público deixar de cumprir sua função em razão do recebimento de vantagens. Formação de quadrilha tem pena aumentada se o bando agir armado.
Os acusados respondem aos crimes de corrupção ativa, corrupção passiva, evasão de divisão, formação de quadrilha, gestão fraudulenta, lavagem de dinheiro e peculato.
A pena mínima é de um ano de prisão para formação de quadrilha e a máxima de 12 anos para peculato, gestão fraudulenta e corrupção ativa e passiva. Independentemente do que o Ministério Público Federal pediu, ninguém pode ficar mais de 30 anos preso, pelas regras do Código Penal brasileiro.
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Também é definido se o réu cumprirá pena em regime fechado, semiaberto ou aberto. Acima de oito anos de prisão, o regime de cumprimento da pena é fechado, ou seja, o condenado fica o tempo todo na prisão. Os regimes semiaberto e aberto permitem ao preso trabalhar e passar o dia fora da penitenciária, por exemplo. Penas de até dois anos podem ser substituídas por prestação de serviços à comunidade.
Prescrição
Na avaliação de especialistas, é possível que alguns réus, mesmo que condenados a penas de prisão, fiquem livres de punição por conta da pena mínima.
Isso porque se a pena dada for de até dois anos haverá a prescrição, ou seja, os condenados não terão de cumpri-la. A prescrição ocorre em relação a cada crime e não em relação ao somatório das penas.
A prescrição é diferente em cada etapa do processo. No atual estágio – do julgamento – , o marco é o recebimento da denúncia. Para crimes de punição de até dois anos, a prescrição ocorre quatro anos depois do recebimento da denúncia.
Como o recebimento da acusação foi em 2007, a pena mínima desses crimes prescreveu em 2011. Penas de dois a quatro anos prescrevem em oito anos, portanto em 2015.
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