Anotações de médicos em um livro e escutas telefônicas divulgadas nesta terça-feira (21) revelam que o esquema de fraude nos plantões dos hospitais estaduais de São Paulo existia pelo menos desde 2005. Cópias do livro de controle dos plantões revelam o que acontecia no Hospital Estadual de Sorocaba, no interior.
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Em janeiro de 2005, uma médica reclamou que o plantão ficou aos cuidados de um residente. “Por não ter médico no pronto-socorro, deixei o plantão da enfermaria aos cuidados de uma residente. Não concordo, mas não tive escolha”, diz ela na gravação.
No mesmo mês, uma médica residente reclama de ter que cuidar dos pacientes sozinha, sem supervisão, como prevê a lei. "Venho fazer uma queixa de que não há plantonista na enfermaria. Como residente, estou sozinha, sem chefe. Um absurdo, pois na escala estava um plantonista."
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Em agosto, uma funcionária reclama do mesmo problema. “Não havia nenhum médico responsável na enfermaria. Acho uma situação de extrema gravidade”.
As queixas continuaram por mais três anos. Em 2008, o diretor técnico de Serviços de Saúde, Antonio Carlos Guerra, advertiu os funcionários. “Este é um livro não de dasabafos ou críticas mal definidas, peço maior cuidado nas anotações".
O Hospital Estadual de Sorocaba está no centro das denúncias que levaram à prisão de 12 pessoas na semana passada. Todas são acusadas de participar de um esquema em que médicos recebiam plantões que não faziam. No domingo (19), o secretário estadual de Esportes, o neurocirurgião Jorge Roberto Pagura, pediu demissão depois de ser citado como suspeito de participação em uma reportagem do Fantástico.
Nesta segunda-feira (20), o coordenador estadual de Serviços da Saúde, Ricardo Tardelli, também pediu demissão. Em uma escuta, ele afirmou que as fraudes aconteciam em vários hospitais.
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A polícia prendeu, na manhã desta quinta-feira (16), 12 pessoas, entre diretores, médicos e funcionários de hospitais, suspeitos de fraudes em licitação e em escalas de plantão que ocorriam na Grande São Paulo e em Sorocaba, no interior do estado, de acordo com a polícia.
O delegado Rodrigo Ayres, do Grupo Antissequestro de Sorocaba, informou que 12 dos 13 mandados de prisão expedidos pela Justiça tinham sido cumpridos até as 11h30. Um suspeito era considerado foragido.
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Além do Grupo Antissequestro, participam da operação o Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público, e a Polícia Militar. Segundo as investigações do MP, verbas destinadas ao pagamento de plantões a servidores do Conjunto Hospitalar de Sorocaba eram desviadas para pessoas que não cumpriam suas jornadas de trabalho.
Entre os presos, está o diretor do Conjunto Hospitalar de Sorocaba. Segundo as investigações, médicos conseguiam receber por plantões em dois hospitais diferentes ao mesmo tempo. A polícia diz que o esquema funcionava pelo menos desde 2008. Onze hospitais da capital paulista e de Itapevi, na Grande São Paulo, e outros dois de Sorocaba foram investigados. Pelo menos 40 pessoas devem ser indiciadas, segundo o MP.
O G1 procurou a Secretaria de Estado da Saúde, que responde pelo Conjunto Hospitalar, e aguarda um posicionamento.
Denúncia ao MP
As investigações começaram no ano passado com uma denúncia feita ao Ministério Público. Segundo a polícia, o esquema funcionava há pelo menos 3 anos. Os médicos que estavam na lista de hospitais públicos eram, na verdade, funcionários fantasmas, de acordo com a denúncia. Eles receberiam por plantões que nunca eram feitos.
Cada médico ganhava R$ 600 por plantão de 12 horas, o que dava até R$ 15 mil por mês, segundo o Ministério Público. Cerca de 300 mil pessoas teriam sido prejudicadas pelo esquema, porque deixaram de ser atendidas. A suspeita é que a fraude tenha desviado mais de R$ 2 milhões de hospitais públicos e particulares.
O diretor do Hospital Regional de Sorocaba foi detido em casa, num condomínio de luxo da cidade. A polícia cumpriu, ainda, mandados de busca e apreensão em 13 hospitais. No Leonor Mendes de Barros, um dos mais movimentados da região, os policiais interditaram o 2º andar do prédio, onde fica o setor administrativo, e recolheram computadores e documentos.
Escutas autorizadas pela Justiça divulgadas nesta terça-feira mostram conversas em que o ex-diretor do hospital de Sorocaba, Heitor Consani, aprende com outro ex-diretor a disfarçar as ausências nos plantões. Sidnei Abdalla diz para Consani justificar as faltas alegando que está atendendo fora do hospital e em outros horários.
Heitor Consani foi diretor do conjunto hospitalar até quinta-feira (18), quando foi preso. Sidnei Abdalla ocupou o mesmo cargo de 2005 até 2008.
O advogado de Heitor Consani, Alberto Toron, informou que aguarda ter acesso às informações do processo e que por enquanto seu cliente não vai se pronunciar sobre as denúncias.
SAIBA MAIS...
A Polícia Civil desarticulou na manhã desta quinta-feira (16) uma quadrilha de médicos e funcionários de hospitais públicos no estado de São Paulo suspeita de fraudes em licitação e em escalas de plantão. Segundo as investigações, médicos conseguiam receber por plantões em dois hospitais diferentes ao mesmo tempo.
Os mandados de prisão e de busca e apreensão estão sendo cumpridos na capital e em cidades do interior. Em São Paulo, até as 8h30, foram cinco detidos. Em Sorocaba, no interior, duas pessoas foram presas, incluindo o diretor do Conjunto Hospitalar da cidade.
Segundo a polícia, o esquema funcionava pelo menos de 2008. Onze hospitais de São Paulo e outros dois de Sorocaba foram investigados.
AS FRAUDES...
A promotora responsável pela investigação do esquema de fraudes em escalas de plantões médicos que aconteciam no Hospital Regional de Sorocaba, no interior de São Paulo, disse nesta segunda-feira (20) que, além das 12 pessoas indiciadas no inquérito, mais 50 podem ter sido beneficiadas pelas irregularidades.
Após as denúncias, que foram ao ar no Fantástico deste domingo (19), o secretário estadual de Esporte, Lazer e Juventude, Jorge Roberto Pagura, pediu demissão. Na manhã desta segunda-feira, o coordenador de Serviços da Saúde de São Paulo, Ricardo Tardelli, também deixou o cargo após a divulgação de gravações feitas com autorização da Justiça. Segundo a polícia, Tardelli tinha conhecimento da fraude em hospitais. O movimento era intenso nesta segunda na delegacia do Grupo Antissequestro de Sorocaba, onde as investigações se concentram.
"Temos a investigação dividida em duas fases. Na primeira fase, que é esta em que estamos no momento, procuramos pegar os principais alvos desse esquema. Posteriormente tem uma segunda fase onde nós vamos partir para aqueles que se beneficiaram com todo esse esquema. Não está descartada a possibilidade de atingir um nível de 40 a 50 pessoas", disse Maria Aparecida Castanho, promotora do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco). De acordo com os promotores, dezenas de testemunhas se apresentaram espontaneamente para dar mais informações sobre o esquema.
"Há um fator extremamente positivo com relação a pessoas que sem nenhuma convocação estão vindo aqui nos prestar importantes informações", afirmou. Até a tarde dessa segunda-feira, oito pessoas permaneciam presas, três haviam sido soltas após prestar depoimento e uma conseguiu deixar a prisão após decisão judicial.
A promotora disse que os suspeitos presos estão sendo indiciados por crimes como falsificação de documentos, desvio de dinheiro público e formação de quadrilha. De acordo com a promotora, as investigações se reportam aos últimos três anos, para que não percam o foco, mas não há prazo previsto para que elas sejam concluídas. "Com três anos já está um monstro essa investigação." A lista pode ir além. "Existem outros crimes que dizem respeito à lei de licitações públicas. Existe um complexo de fatos de documentos e de provas que temos de arregimentar."
Tardelli pode ser chamado a depor em Sorocaba, segundo a promotora. "Ele é investigado. Nós vamos investigar todos os que forem apontados como possíveis autores desses crimes." Quanto a Pagura, a decisão caberá ao procurador-geral de Justiçca. "Nós vamos encaminhar os materiais que foram apreendidos aqui para o procurador-geral de Justiça e ele que vai avaliar se vai continuar ou não. Porque até agora, para nós, doutor Pagura é secretário de estado e nós não temos atribuição para investigá-lo. Quem tem é o procurador-geral."
Maria Aparecida Castanho afirmou que o fato de os médicos não baterem ponto eletrônico colaborou para o esquema de fraudes. "Era uma falha no sistema da secretaria", afirmou. "Foi importante essa colocação da secretaria, de colocar ponto eletrônico e fazer auditoria nos hospitais. Isso vai acabar levantando que não era só no regional que isso acontecia."
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O governador Geraldo Alckmin afirmou nesta segunda-feira (20), em São Paulo, que o governo paulista fará uma auditoria em todos os hospitais do estado. A medida foi tomada após denúncia de fraudes em escalas de plantões médicos que supostamente aconteciam em hospitais da capital paulista e do interior do estado. Após as denúncias, que foram ao ar no Fantástico deste domingo (19), o secretário estadual de Esporte, Lazer e Juventude, Jorge Roberto Pagura, pediu demissão. Nesta manhã, o coordenador de Serviços da Saúde de São Paulo, Ricardo Tardelli, também deixou o cargo após a divulgação de gravações feitas com autorização da Justiça. Segundo a polícia, Tardelli tinha conhecimento da fraude em hospitais.
Segundo a reportagem do Fantástico, foram encontrados indícios de que as fraudes nos plantões não aconteceram só em Sorocaba, mas se espalharam por grandes hospitais públicos da capital paulista. Durante o trabalho policial, também surgiram suspeitas contra o secretário. Na delegacia, uma das pessoas presas nesta semana em Sorocaba negou que ele trabalhasse no hospital.
Procurado pelo Fantástico, Jorge Pagura não quis gravar entrevista. O agora ex-secretário afirmou, em nota, que nunca fez plantões no hospital de Sorocaba nem recebeu por eles. E que o trabalho que realizava lá era o de desenvolvimento de projetos, com verba do SUS.
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“Vamos auditar todos os nossos hospitais”, disse Alckmin. Segundo o governador, um novo interventor para o Hospital Regional de Sorocaba será designado até terça-feira (21), além de uma série de mudanças no controle de marcação de ponto de profissionais da saúde no estado.
Alckmin disse ainda que pretende implantar uma “via rápida”, como há na polícia, para que as denúncias recebidas sejam rapidamente apuradas e os envolvidos, punidos.
Alckmin participou do lançamento do Curso de Empreendedorismo do Banco do Povo Paulista, no Palácio dos Bandeirantes, na Zona Sul de São Paulo. Quando questionado se Tardelli havia pedido demissão, o governador falou que haverá substituição na Coordenação de Serviços da Saúde. “Se não saiu, vai sair. Nós vamos substituir também a coordenadoria.”
Sobre o ex-secretário de Esportes, o governador afirmou que Pagura não era funcionário do estado. “Ele nunca recebeu do estado [paulista]. Não teve nenhum envolvimento com licitação, nada disso. Ele é funcionário federal do SUS, que em 2009 foi comissionado e ficou dois anos comissionado no Hospital de Sorocaba e, segundo ele [o ex-secretário], para cuidar de projetos científicos, atividades relacionadas à saúde”, informou. Segundo Alckmin o secretário-adjunto de Esporte, Lazer e Juventude, José Benedito, assumirá a pasta até que haja a nomeação do novo titular.
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O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, aceitou na tarde deste domingo (19) o pedido de demissão do secretário estadual de Esporte, Lazer e Juventude, Jorge Roberto Pagura. Neurocirurgião de renome, ele é suspeito de receber dinheiro público da saúde sem trabalhar. Segundo nota enviada pelo governo, ele pediu demissão para facilitar os esclarecimentos dos fatos mostrados em reportagem do Fantástico deste domingo.
Veja o site do Fantástico
Procurado pelo Fantástico, Jorge Pagura não quis gravar entrevista. O agora ex-secretário afirmou, em nota, que nunca fez plantões no hospital de Sorocaba nem recebeu por eles. E que o trabalho que realizava lá era o de desenvolvimento de projetos, com verba do SUS.
Mais de 70 profissionais de saúde foram investigados, na capital e no interior, sob suspeita de desvio de dinheiro público. A Justiça decretou a prisão de 13 pessoas, entre elas seis médicos, dois dentistas, uma enfermeira e dois empresários. Segundo as investigações, a maioria recebia salário, mas simplesmente não aparecia para trabalhar nos plantões. Por telefone, alguns admitem a fraude, como mostram gravações autorizadas pela Justiça. “Você sabe, eu sei que, durante um período, você se beneficiou daquela história do plantão”, diz um dos envolvidos.
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A investigação da polícia e do Ministério Público começou no Hospital Regional de Sorocaba, um dos principais do interior paulista. Nas escutas telefônicas, a precariedade do atendimento fica evidente. “Dois estão neste momento com fratura exposta de mão e não tem vaga no centro cirúrgico, não tem anestesista”, diz um funcionário.
Foram encontrados indícios de que as fraudes nos plantões não acontecem só em Sorocaba e se espalham por grandes hospitais públicos da capital paulista. Durante o trabalho policial, também surgiram suspeitas contra o secretário. Na delegacia, uma das pessoas presas esta semana em Sorocaba negou que ele trabalhasse no hospital.
O nome do secretário surgiu durante o monitoramente do homem que foi diretor-geral do Hospital de Sorocaba entre outubro de 2008 e dezembro do ano passado. No dia 10 de dezembro, ele recebeu uma ligação de Jorge Roberto Pagura, que não estava sendo investigado pela polícia. O neurocirurgião assumiria a Secretaria de Esporte de São Paulo um mês depois.
O diretor propõe que Pagura assine o ponto de frequência em outro hospital. “O teu ponto está sob controle. Mas daí vamos tomar cuidado. Semana que vem vamos pôr em algum lugar mais seguro”, diz. Pagura responde “está certo”, mas aparenta preocupação.
Controles de frequência
Na quinta-feira passada, a polícia cumpriu mandados de busca e apreensão em oito hospitais públicos: sete na capital paulista e mais o regional de Sorocaba. Doze pessoas foram presas. Uma é a ex-chefe de recursos humanos do hospital de Sorocaba. Segundo as investigações, ela sabia quem não fazia plantões e recebia propina para esconder a fraude.
É a mulher quem fala sobre o neurocirurgião Jorge Pagura em um vídeo obtido pelo Fantástico, em que nega que o médico ia trabalhar no hospital. Sexta feira, em Sorocaba, no prédio da Diretoria Regional de Saúde, a DRS, foram encontrados, escondidos num armário, os controles de frequência de Jorge Pagura. Nos documentos consta que, entre 2009 e 2010, ele deveria dar expediente no hospital de Sorocaba de segunda a sexta, das 8h ao meio-dia.
“Ele mandava a frequência para mim e eu encaminhava lá para a DRS”, diz a funcionária no vídeo. Ao ser questionada se a frequência já chegava pronta, ela balança a cabeça positivamente. A mulher contou ainda que este mês foi nomeada para trabalhar na Secretaria de Esporte, Lazer e Juventude - a pasta comandada por Pagura. “Eu sou secretária. Agora eu estou na assessoria de imprensa, mas sou secretária”, disse.
Em nota, Pagura disse que ela foi nomeada para um cargo na Coordenadoria da Juventude. Mas que a nomeação está cancelada. A mulher vai responder ao processo em liberdade.
Investigação
Há um ano, policiais civis e promotores que combatem o crime organizado começaram a investigar o Hospital de Sorocaba. E descobriram que o desvio passou dos R$ 2 milhões. “Se houvesse um controle efetivo, se constataria facilmente que a carga horária desenvolvida por essas pessoas é humanamente impossível. Nós temos aqui médico com 220 horas semanais”, afirma a promotora de Justiça Maria Aparecida Castanho. A semana - incluindo sábado e domingo - tem 168 horas.
Entre os acusados, está a cirurgiã-geral Maria Helena Alberici. Em 2010, de acordo com a polícia, recebeu R$ 14 mil sem trabalhar. Já Tânia Maris de Paiva é cirurgiã-dentista e tinha um cargo importante no hospital: era responsável por apurar irregularidades. Mas uma gravação mostra que Tânia sabe que Maria Helena Alberici recebe sem aparecer no trabalho e diz o que ela tem que fazer. “Como você nunca foi no hospital, a sua cara lá não deveria aparecer em momento nenhum”, diz ela. “Eu acho, assim, como eu não sou conhecida no hospital até que não teria problema”, responde a outra mulher.
A própria Tânia Maris de Paiva é acusada de receber, em 2010, cerca de R$ 49 mil por 80 plantões, sem atender ninguém. “Eu ganhava sete pau e quatrocentos, ganhava os plantões da diretoria e um prêmio de incentivo”, disse em um telefonema. Uma funcionária que trabalha há mais de 20 anos no hospital é uma testemunha da polícia. Ela diz que nunca viu Tânia Maria. “Era frequência de assinatura. Não tinha o ponto eletrônico”, contou.
“Essas pessoas não compareciam ao local de trabalho, causando um enorme prejuízo para a sociedade”, afirma o delegado Wilson Negrão. O Hospital Regional de Sorocaba atende em média 20 mil pessoas por mês. No dia 26 de maio, uma quinta-feira, a fila era imensa do lado de fora. Muitos pacientes haviam chegado de madrugada.
O aposentado Antonio Carlos Gabilan procurou atendimento com a filha de 9 anos. “Desde o começo do ano, ela está tentando marcar consulta com dentista”, disse. Um funcionário confirma a dificuldade. “Tem consulta que demora mesmo. Neurocirurgias, só para o ano que vem agora. Falta médico, falta tudo”, disse.
A equipe do Fantástico flagrou uma cena dramática no hospital. Dona Domingas, de 56 anos, estava passando mal. “Eu nem sei se ela vai aguentar chegar lá onde faz o exame”, diz a filha dela, Elizete Gonçalves. A idosa, que tem Mal de Chagas há 35 anos, vai fazer um exame do coração. A filha diz que Domingas espera há três meses por uma consulta. Depois de quase 2 horas de espera, ela é atendida. “Eu achei a médica com muito descaso para fazer exame. Falou que é por causa de cigarro. Mas minha mãe não fuma”, disse a filha. As duas vão embora com a certeza de que a consulta não valeu de nada.
Telefonema
Um dos acusados de fraudar os plantões é Heitor Consani. Este ano, foi promovido e assumiu a direção-geral do Hospital de Sorocaba. Em um telefonema, realizado mês passado, Consani recebeu um conselho do ex-chefe dele. Antônio Carlos Nasi foi o diretor de saúde da região de Sorocaba de 2007 a fevereiro deste ano.
“Uma das coisas que talvez fosse interessante era pensar na devolução do dinheiro”, diz o ex-chefe em uma gravação autorizada pela Justiça. “Isso a gente chama de uma defesa prévia. Já fui uma vez indiciado. Procurei o promotor, fiz os cálculos e fiz a devolução do dinheiro. Sai como bom moço da história”, completa ele.
Este ano, vários médicos e dentistas acusados de receber dinheiro público irregularmente em Sorocaba passaram a trabalhar na capital paulista. O cirurgião-dentista Tarley de Barros recebeu, no ano passado, por 250 plantões, quase R$ 125 mil. Mas a investigação da polícia e do Ministério Público mostra que ele nem chegou a pisar no Hospital de Sorocaba. E que, se tivesse ido, pelo número de horas recebidas, teria atendido quase 10 mil pessoas em um ano.
Tarley de Carros trabalha num consultório nos Jardins, bairro nobre da capital paulista, a 90 quilômetros de Sorocaba. Segundo os promotores, nos horários de alguns dos supostos plantões, na verdade, ele estava na clínica particular, onde a consulta custa R$ 300. No Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde - mantido pelo Ministério da Saúde - Tarley de Barros também aparece como funcionário de um hospital público: o da Vila Nova Cachoeirinha, um dos maiores da capital paulista.
Uma funcionária informou que ele atende de segunda-feira, por volta das 8h30 e 9h. Um produtor do Fantástico voltou nesse dia da semana, e Tarley de Barros chegou atrasado. Ele ficou na sala da diretoria e, 50 minutos depois, foi embora. O cirurgião-dentista deveria trabalhar 20 horas por semana nesse hospital, mas, em ligações realizadas durante a semana toda, a informação no hospital era que ele não apareceu mais.
A equipe do Fantástico foi outra vez até lá na segunda-feira, 13 de junho. Chegou por volta das 8h e ficou em um apartamento em obras bem em frente ao Hospital Vila Nova Cachoerinha, de onde havia uma visão privilegiada do estacionamento dos médicos. Até as 11h20, o dentista não havia aparecido para trabalhar. Uma funcionário confirmou a ausência dele.
“Eles migravam de um hospital para outro, sempre a mesma equipe. o que nós chamou a atenção no decorrer dessa investigação”, comenta o delegado Wilson Negrão. No Hospital Ipiranga, na Zona Sul de São Paulo, trabalha, pelo Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde, a cirurgiã-geral Maria Helena Alberici. Ela deveria fazer 30 horas por semana, mas uma funcionária confirmou que ela não é presente por lá.
O Ministério da Saúde informou que o cadastro nacional serve para controlar o destino do dinheiro público. A Secretaria de Saúde de São Paulo informou que orienta os hospitais a manter os dados em dia. De acordo com esse cadastro do Ministério da Saúde, também trabalharia no Hospital Ipiranga a médica especialista em doenças do aparelho digestivo Vera Regina Salim. “Já vai fazer dois anos que ela não está aqui”, diz uma funcionária.
A médica tem um consultório em São Paulo. O produtor do Fantástico marca uma consulta, paga R$ 250 e puxa conversa sobre Sorocaba. Sem saber que estava sendo gravada, ela fala que não chegou a trabalhar no município. “Sorocaba eu conheço bem também porque é aqui do lado e meu marido era diretor do hospital lá”, disse. O marido dela é Ricardo Salim e foi diretor-geral do hospital de Sorocaba entre outubro de 2008 e dezembro passado.
O secretário de Saúde de São Paulo, Giovanni Guido Cerri, disse o que pretende fazer após as denúncias. “A nossa impressão é que é uma quadrilha. Nós estabelecemos a obrigatoriedade do ponto eletrônico, que será implantada a curto prazo e também uma auditoria em relação à presença, em particular aos plantões”, afirma.
Prisões
O casal Vera Regina e Ricardo Salim foi preso na quinta-feira (16). “Ele me assegurou que todos os procedimentos adotados eram legítimos. São funcionários públicos dedicados. No caso do meu cliente e da minha cliente, são a voz que sempre prestaram bons serviços para o estado”, afirma Pedro Luiz de Oliveira, advogado do casal.
A cirurgiã-geral Maria Helena Alberici também foi para a cadeia e o advogado dela não quis se manifestar. O de Tarley de Barros disse que o cirurgião-dentista negou que ele tenha recebido dinheiro público sem trabalhar nos hospitais de Sorocaba e da Vila Nova Cachoeirinha, em São Paulo. “Ele pode não estar atendendo diretamente o paciente, mas está no hospital, coordenando a equipe dele de trabalho. Cumpre a jornada, tanto que ele assina o ponto. Se ele não assinar não consegue receber da secretaria”, explica o advogado Antônio Osmar Baltazar.
O diretor-geral do Hospital de Sorocaba, Heitor Consani, conseguiu um habeas corpus neste sábado (18) e foi solto. “Ele nega peremptoriamente. Eu quero ter pelo menos acesso aos autos para poder me posicionar sobre essa situação”, afirma o defensor de Consani, Alberto Zacharias Toron. Antônio Carlos Nasi também não está mais preso. A equipe do Fantástico deixou vários recados, mas ele não retornou as ligações. A dentista Tânia Maris de Paiva teve a prisão decretada e está foragida.
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